Item foi apresentado como contribuição das populações indígenas para discussão climática durante reuniões do Programa de Trabalho sobre Transição Justa
Fábio Bispo
As negociações climáticas da COP30, em Belém, avançaram nesta sexta-feira (14) com a apresentação — pelo Caucus Indígena — de uma proposta para a criação de zonas livres de exploração de petróleo, gás natural e mineração em áreas habitadas por povos indígenas isolados ou de recente contato. A ideia começou a circular nos debates do Programa de Trabalho sobre Transição Justa (JTWP), criado na COP28, como contribuição da delegação indígena.
A proposta aparece ainda entre colchetes no documento, o que significa que está em disputa. Mesmo assim, o fato de ter sido registrada formalmente representa um avanço significativo na discussão internacional sobre a proteção de grupos extremamente vulneráveis diante da expansão das fronteiras de petróleo, gás e dos minerais críticos necessários à transição energética.
“Nós vemos a inclusão deste tema nas negociações como uma grande vitória desta COP. Existe um consenso de que os povos em isolamento ou de recente contato não podem ser consultados, e que ninguém pode falar por eles”, afirma Gisela Hurtado, coordenadora de campanhas pela Amazônia, Stand.earth, e que acompanha as discussões sobre transição justa na conferência.
A organização tem atuado para sensibilizar os países membros da convenção para ampliar essas zonas de exclusão, incluindo também regiões ambientalmente sensíveis, como as florestas tropicais.
“As áreas que queremos proteger são aquelas que são ambientalmente mais sensíveis. Queremos que a Amazônia inteira seja excluída das atividades extrativas, mas não vejo que consigamos fazer essas discussão nesta COP”, afirmou.
O ponto sobre povos isolados aparece em três partes diferentes do parágrafo 12 do rascunho de decisão, reconhecendo explicitamente os direitos dos povos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial. O trecho afirma que sua proteção exige a criação de zonas de exclusão, orientadas pelos princípios de precaução e não contato:
“[…] proteções para os povos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial por meio do estabelecimento de zonas de exclusão, consistentes com os princípios de precaução e não contato”, diz o rascunho da decisão.
A proposta veio dos aportes do Caucus Indígena, colhida junto aos movimentos dos povos tradicionais, principalmente os da Amazônia.
Os trechos em disputa devem ser negociados ao longo da próxima semana, quando os países iniciam o processo de “limpeza” do texto e a eliminação dos colchetes. A inclusão ou exclusão definitiva da proposta dependerá de articulações políticas intensas e da disposição de grandes produtores de combustíveis fósseis em aceitar limites explícitos à expansão de suas fronteiras de exploração.
21% das florestas tropicais estão reservadas para exploração fóssil
Na tarde desta sexta-feira (14), a Stand.earth apresentou novos dados sobre a exploração de petróleo e gás em florestas tropicais de América do Sul, África e Ásia, durante uma conferência na Blue Zone — a área onde ocorrem as negociações formais da COP30.
Segundo a organização, 183 milhões de hectares de florestas tropicais ao redor do mundo já estão reservados para exploração de petróleo e gás, o equivalente a 21% de todas as florestas tropicais existentes. A situação mais crítica está na África, onde 40% da floresta da Bacia do Congo se sobrepõem a blocos petrolíferos. No Sudeste Asiático, 22% das florestas estão comprometidas com a indústria fóssil, enquanto, na Amazônia, o índice é de 14%.
Durante o painel, o cacique Jonas Mura, liderança indígena do Amazonas, denunciou a pressão da indústria de gás sobre territórios do povo Mura, especialmente o avanço da Eneva no Campo do Azulão.
Desde que a empresa iniciou a exploração de gás natural no Campo do Azulão, os Mura relatam contaminação da água, fuga dos animais e perda das condições de pesca e caça que sustentam seu modo de vida. Eles contestam ainda a ausência de consulta prévia, livre e informada, direito assegurado pela Convenção 169 da OIT, e afirmam que o Estado permitiu o avanço da empresa sem apresentar, no início do licenciamento, os estudos de impacto ambiental exigidos por lei.
“Estão extraindo gás natural de um território que é nosso, que é sagrado”, afirmou Mura. “Nós estamos ficando sem água potável, sem peixe, estamos ficando sem a nossa Amazônia que está sendo destruída para exploração em terras indígenas”, emendou o indígena.
Colômbia é primeiro país a criar zona livre de petróleo na Amazônia
A Colômbia anunciou, durante a COP30 em Belém, que se torna o primeiro país amazônico a declarar toda a sua porção do bioma como zona livre de petróleo e mineração, estabelecendo uma barreira inédita à expansão das fronteiras extrativas na região. A decisão, apresentada pela ministra do Meio Ambiente Irene Vélez Torres em encontro da OTCA, transforma mais de 48 milhões de hectares — 42% do território continental colombiano — em uma área reservada exclusivamente à proteção de recursos naturais renováveis.
O governo colombiano apresentou a medida como um “ato de soberania ambiental” e um convite para que outros países amazônicos sigam o mesmo caminho. Ao propor uma “aliança amazônica pela vida”, Vélez Torres destacou que a floresta não reconhece fronteiras e que sua proteção exige ações coordenadas, reforçando a agenda de transição energética do governo Gustavo Petro e ampliando a pressão sobre países que continuam autorizando novas frentes de exploração de petróleo e mineração na Amazônia.
Esta reportagem foi produzida por InfoAmazonia, por meio da Cobertura Colaborativa Socioambiental da COP 30. Leia a reportagem original aqui.















